Geleira













nem todos os dias são de cólera
alguns são de esfumaçada coragem
contra o frio da cólera

o enforcado pode durar
bem mais que supúnhamos
eu, você, toda gente

há notícias que numa vasta manhã
o gelo começou a derreter
num ponto azul da terra
e era um gelo conhecido das guerras

quando terminamos uma dolorosa travessia
ninguém nos abraça ou nos oferece festejo
nossa testemunha solitária
escreve um bilhete, um poema na geleira
e uma onda de alegria
se revela miúda, silenciosa

ainda assim quebra a vidraça, as emergências
atravessa os tímpanos
contrai a carne de dentro até o susto
de permanecer viva

Patricia Porto

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