O Natal de Jesus




















Quando o sol irrompeu nos cimos azulados
e deu vida e calor às árvores e aos prados,
e os pássaros, trinando, a alvorada anunciaram
e a luz triunfal do dia entre ovações saudaram,
dir-se-ia a natureza em festa esplendorosa
no radiante fulgor da manhã cor-de-rosa.

Quem fosse até Belém naquele instante, certo,
deixando atrás de si a poeira do deserto,
havia de sentir um gozo estranho e ingente,
uma alegria nova, imensa, surpreendente,
porque, na expectação do mundo estarrecido,
nascera, finalmente, o Cristo prometido.

Os homens a buscá-lo o seu nome exaltavam
e, cheios de ventura, uns aos outros falavam,
enquanto pelos céus divina melodia
de cantos imortais os páramos enchia.

Mas, eterno desígnio, a pequenina criança,
que era do mundo inteiro a mais bela esperança,
nascera, humildemente, em pobre estrebaria,
porque nenhum lugar na estalagem havia
e agora, ao maternal regaço reclinada,
mostrava à luz do dia a face mui rosada.

A doce mãe, feliz na sua fé ardente,
olhava para o filho enternecidamente,
não sonhando sequer o drama extraordinário
de que seria palco o monte do Calvário!...

Mas havia de ser assim...
Estava escrito
nas páginas de luz do Livro do infinito
e um dia, sobre o lenho infame do madeiro
Ele seria exposto assim, como o Cordeiro,
para que se cumprisse a divinal vontade
e fosse redimida e salva a humanidade.

E por isso as canções que os pássaros entoavam
e os lampejos do sol que os campos redouravam
festejavam, também, nessa alvorada loura,
o Salvador nascido em pobre manjedoura!



Jonathas Braga


Fonte: O Caminho da Cruz (JUERP, 1962)


Blog:http://poesiaevanglica.blogspot.com.br


Imagem do site: recadoface.com.br

Poema de Natal









Para isso fomos feitos:
Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos —
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.
Assim será nossa vida:
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos —
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.
Não há muito o que dizer:
Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez de amor
Uma prece por quem se vai —
Mas que essa hora não esqueça
E por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.
Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte —
De repente nunca mais esperaremos…
Hoje a noite é jovem; da morte, apenas
Nascemos, imensamente.

Vinicius de Moraes
Imagem da Internet

A um Poeta





















Longe do estéril turbilhão da rua,
Beneditino, escreve! No aconchego
Do claustro, na paciência e no sossego,
Trabalha, e teima, e lima, e sofre, e sua!

Mas que na forma se disfarce o emprego
Do esforço; e a trama viva se construa
De tal modo, que a imagem fique nua,
Rica mas sóbria, como um templo grego.

Não se mostre na fábrica o suplício
Do mestre. E, natural, o efeito agrade,
Sem lembrar os andaimes do edifício:

Porque a Beleza, gêmea da Verdade,
Arte pura, inimiga do artifício,
É a força e a graça na simplicidade.


Olavo Bilac
Pintura de Justina Kopania - site Open ArtGroup



Dom Casmurro





















Se teu olhar te traiu
Na busca do que foi perdido
O semblante sólido agora caiu
Quebrando o disfarce antigo

Atores de um silencioso teatro
Com movimentos e diálogos ensaiados
Durmo e acordo com o abstrato
Gentileza e sorrisos mimados

As cenas com que foi ludibriado
São perfeitas aos olhos apaixonados
Doce visão para um enganado
Que se converteu num ódio enciumado.

O que era desconfiança virou realidade
Qualidades, gordura enfeitada de confeitos.
Que esconde o integro sabor da interioridade
Diante destes olhos agora são defeitos.

O que era incerto virou certo
Visão esclarecida da verdade
O encantado jardim virou deserto
O amor fiel virou maldade.


Henrique Rodrigues Soares – O que é a Verdade?
Imagem da Internet

Ritos, crenças e rotinas
















Ritos, crenças e rotinas
Erva ou medicina
Gravata, crachá e microondas
e os alarmes e os despertadores
e os metrônomos
máquinas de ponto


Se varre e deixa o chinelo virado
Cuidado, a mãe morre
O que nos socorre são os amuletos
são nossas muletas
Algo a que a gente possa se agarrar
E carregar no peito
De pingente, no colar


Pra não colidir com os astros
com a força dos números
pra que possa a cabala...
três vezes, sete ondas, aos pulos
bate na madeira dura
afasta a inveja e a ira
e a doença e o quebranto
e a extensão do pranto
traz de volta a pessoa amada
e a beija e se benze
em três dias, três vezes


Faz figa
não deixe que alguém rogue praga
os dedos cruza
Parece TOC, parece truque
um estoque de manias ou contrastes
algo que inspire e equilibre


Como diz o cancioneiro
quem ilumina as rotinas
é o ... meu pequeno talismã
cabe na mão a figura do santo
a fé no orixá ou no terço
num deus, no nada ou em algo
no semáforo


na foto do filho
no relógio de ponteiro
parado no horário do nascimento
da pessoa mais amada


Somos inseguros
nos sentimos ameaçados
e buscamos abrigos
associações nos objetos
que ejetam o desespero
diminuição dos riscos
parecemos protegidos
contra as adversidades


Por isso
amarra a fitinha no pulso
faça três desejos pro gênio
antes de apagar a velha, guarda
o trevo de quatro folhas


E se o décimo terceiro apóstolo foi Judas
que chegou na santa ceia
é o décimo terceiro salário que te ajuda
quando a coisa tá feia


qual o problema com o treze?
tudo é dicotômico e eu questiono
sou metódico, meio cético, sistemático
de El Loco a Zagallo
que acho que gostaria do meu nome
Alan Salgueiro tem treze letras


Novenas, correntes
peregrinos, batucadas
jejuns e orações
agradecimentos e oferendas
e promessas pagas
e palavras mágicas
como lidamos com as incertezas?
como buscamos nossas defesas?


O goleiro faz das balizas seu templo
beija as traves, faz a corte
todo o ritual do esporte
Sai da cama com o pé direito
O primeiro a pisar a grama
entra em campo
e até no gol perdido há menção
pro pai, pro filho e pro espírito santo


A mandinga e a simpatia
causas impossíveis
Aquele torcedor lendário
que chacoalhava o galho
de arruda bem perto da cara
pedindo ajuda, qualquer livramento
nem ele evitou o rebaixamento


Eita diacho
miué encalhada é bicho engraçado
castiga a imagem
deixa o San tantoin de cabeça pra baixo


Azar no escuro dos espelhos quebrados
sete anos
ou debaixo das escadas
não tragam maus fluidos


No nosso íntimo
os concretos são insuficientes
daí o credo
pedimos reforços pra forças maiores


quem dera fosse fácil ser tão confiante
e independente e ter sempre um chão
quem dera que todos os ritos se resumissem
a dar abraços, entregar as flores

e fazer a saudação!



Alan Salgueiro

Imagem da Internet

Poema favorito de Nelson Mandela























Invictus

Out of the night that covers me,
Black as the pit from pole to pole,
I thank whatever gods may be
For my unconquerable soul.

In the fell clutch of circumstance
I have not winced nor cried aloud.
Under the bludgeonings of chance
My head is bloody, but unbowed.

Beyond this place of wrath and tears
Looms but the Horror of the shade,
And yet the menace of the years
Finds and shall find me unafraid.

It matters not how strait the gate,
How charged with punishments the scroll,
I am the master of my fate:
I am the captain of my soul.




Invictus

Desta noite que me cobre
Negra como um poço de borda a borda
Eu Agradeço a quaisquer deuses que hajam
Por minha alma inconquistável

Na cruel garra da circunstância
Eu não recuei nem gritei
Sob os golpes da sorte
Minha cabeça está ensanguentada mas não curvada

Além deste lugar de fúria e lágrimas
Surge apenas o horror da sombra
E ainda com a ameaça dos anos
Encontra, e há de encontrar-me, sem temor

Não importa quão estreito o portão
Quão carregado de punições o pergaminho
Eu sou o mestre me meu destino
Eu sou o capitão de minha alma.


William Ernest Henley (1849-1903)
Tradução do site culturifique.blogspot.com.br
Imagem - Tela de Dmitry Spiros - Open ArtGroup

O Tempo seca o Amor

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