Negro


















Pesa em teu sangue a voz de ignoradas origens.
As florestas guardaram na sombra o segredo da tua história.

A sua primeira inscrição em baixo-relevo
foi uma chicotada no lombo.

Um dia
atiraram-te no bojo de um navio negreiro.
E durante longas noites e noites
vieste escutando o rugido do mar
como um soluço no porão soturno.

O mar era um irmão da tua raça.

Uma madrugada
baixaram as velas do convés.
Havia uma nesga de terra e um porto.
Armazéns com depósitos de escravos
e a queixa dos teus irmãos amarrados em coleiras de ferro.

Principiou aí a sua história.

O resto,
o que ficou para trás,
o Congo, as florestas e o mar
continuam a doer na corda do urucungo. (*)


Raul Bopp
De: “Urucungo: poemas negros” (1932)

Nota:

(*) Instrumento musical africano.

Negro. In: __________. Seleta em prosa e verso. Organização, estudo e notas do Prof. Amariles Guimarães Hill. Rio de Janeiro, GB: Livraria José Olympio Editora; Brasília, DF: Instituto Nacional do Livro - Ministério da Educação e Cultura, 1975. p. 13. (Coleção “Brasil Moço”)

Nenhum comentário:

O Tempo seca o Amor

O tempo seca a beleza, seca o amor, seca as palavras. Deixa tudo solto, leve, desunido para sempre como as areias nas águas. O tempo seca a ...

Nos últimos 30 dias.