Morre o dia. Do quadro da vidraça,
nós contemplamos silenciosamente
o adeus do sol à terra, à luz escassa,
à meia-luz da tarde confidente.
São como um par de noivos que se abraça;
— esse roxo dorido do sol poente
tem a tristeza voluptuosa e ardente
de um longo abraço que se desenlaça.
Uma ânsia de viver me abala os músculos;
dão-me os teus olhos a impressão furtiva
de dois grandes, tristíssimos crepúsculos.
E, como a orquestração de um mau desejo,
quebra o sono da tarde pensativa
o gorjeio frenético de um beijo.
Guilherme de Almeida
Da obra original “Nós” (1914-1917). Extraído de Sonetos/ Guilherme de Almeida, Imprensa Oficial, São Paulo (SP) Brasil, 2ª edição, pág. 27.

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