O Canto da Estrada Aberta


















1
A pé e de coração leve eu tomo a estrada aberta,
Saudável, livre, o mundo diante de mim,
O longo caminho de terra diante de mim me levando para onde quer que eu escolha.

Doravante eu não peço boa sorte, eu mesmo sou a boa sorte,
Doravante eu não choramingo mais, não adio mais, não preciso de nada,
Basta de reclamações em interiores, bibliotecas, querelas críticas,
Forte e satisfeito eu viajo a estrada aberta.

A terra, isto é o suficiente,
Eu não quero as constelações mais perto,
Eu sei que elas estão muito bem lá onde estão,
Eu sei que elas bastam para aqueles que pertencem a elas.

(Mesmo aqui eu carrego meus velhos e deliciosos fardos,
Eu os carrego, homens e mulheres, eu os carrego comigo para onde quer que eu vá,
Eu juro que é impossível me livrar deles,
Eu estou preenchido com eles, e vou preenchê-los de volta).


2.
Você eu adentro, estrada, e olho em volta, acredito que você não é tudo o que há aqui,
Eu acredito que muito não-visto também está aqui.
Aqui a profunda lição da recepção: nem preferência, nem negação,
O negro com sua cabeça encaracolada, o meliante, os enfermos, o analfabeto, não são negados;
O nascimento, a busca apressada pelo médico, o passo lento do pedinte, o cambalear do bêbado, a festa sorridente dos mecânicos,
O jovem foragido, a carruagem do rico, o esnobe, o casal fugitivo,

O mercador que madruga, o carro funerário, o transporte da mobília para a cidade, o retorno de volta da cidade,
Eles passam, eu também passo, qualquer coisa passa, nenhum pode ser interditado,
Nenhum deixará de ser aceito, nenhum deixará de ser querido por mim.


3.
Você ar que me oferece fôlego para respirar!
Vocês objetos que chamam da difusão os meus sentidos e lhes dão forma!
Você luz que envolve a mim e a todas as coisas em chuvas delicadas e constantes!
Vocês caminhos gastos nos desníveis irregulares pelos acostamentos!
Eu acredito que vocês são latentes de existências não-vistas, vocês me são tão caros.

Vocês passeios sinalizados das cidades! Vocês sarjetas fortes nas beiradas!
Vocês barcas! Vocês pranchas e postes do cais! Vocês laterais revestidas de madeira! Vocês barcos distantes!

Vocês colunas de casas! Vocês fachadas encrustadas de janelas! Vocês telhados!
Vocês sacadas e entradas! Vocês cumeeiras e grades de ferro!
Vocês janelas cujas cascas transparentes podem expor tanto!
Vocês portas e degraus ascendentes! Vocês arcos!
Vocês pedras cinzentas das calçadas intermináveis! Vocês cruzamentos percorridos!
De tudo que os tocou, acredito que vocês transferiram para si mesmos, e agora transfeririam o mesmo secretamente para mim,
De vivos e mortos vocês povoaram suas superfícies impassivas, e assim devem ser os espíritos visíveis e amigáveis para comigo.


4
A terra expandindo à direita e à esquerda,
A imagem viva, cada parte em sua melhor luz,
A música se derramando onde é querida e parando onde não é querida,
A voz jubilosa da estrada pública, o sentimento fresco e alegre da estrada.

Ó rodovia eu viajo, você me diz Não me abandone?
Você diz Não ouse, se me deixar você estará perdido?
Você diz Eu já estou pronta, bem batida e inegável, adere a mim?

Ó estrada pública, Eu digo de volta Eu não tenho medo de te deixar, embora eu te ame,
Você me expressa melhor do que eu mesmo posso me expressar,
Você será mais para mim do que meu poema.

Eu acho que feitos heróicos foram todos concebidos ao ar livre, e todos os poemas livres também,
Eu acho que eu poderia parar aqui e fazer milagres,
Eu acho que eu devo gostar de qualquer coisa que eu encontre na estrada, e qualquer um que me veja deve gostar de mim,
Eu acho que qualquer um que eu vir deve estar feliz.


5.
Desta hora em diante eu me declaro solto de linhas e limites imaginários,
Indo onde eu me alisto, meu próprio mestre, total e absoluto,
Escutando os outros, levando bastante em consideração o que eles dizem,
pausando, procurando, recebendo, contemplando,
Com gentileza, mas com vontade inegável, me afastando das travas que me travariam.
Eu inalo grandes lufadas de espaço,
O leste e oeste são meus, e o norte e o sul são meus.

Eu sou maior, melhor do que eu pensei,
Eu não sabia que eu continha tanta bondade.

Tudo parece bonito para mim,Eu posso repetir várias vezes para mulheres e homens Você me fez tão bem Eu faria o mesmo por você,
Eu recrutarei para mim e para você em minha ida,
Eu me espalharei entre homens e mulheres em minha ida,
Eu lançarei uma nova satisfação e dureza entre eles,
Quem quer que me negue não me incomodará,
Quem quer que me aceite ele ou ela será abençoado e me abençoará.


6.
Agora se mil homens perfeitos fossem aparecer isto não me surpreenderia,
Agora se mil belas figuras de mulheres aparecessem isto não me impressionaria.

Agora eu vejo o segredo da criação das melhores pessoas,
É crescer ao ar livre e comer e dormir com a terra.

Aqui há espaço para um grande feito pessoal,
(Tal feito se apodera dos corações de toda a raça humana,
A efusão de sua força e vontade supera a lei e zomba de toda a autoridade e todo argumento contrário a si).

Aqui está o teste da sabedoria,
A sabedoria não é testada definitivamente nas escolas,
A sabedoria não pode ser passada de alguém que a tem para outro que não a tem,
A sabedoria é da alma, não é suscetível de prova, é sua própria prova,
Se aplica a todos os estágios e objetos e qualidades e é contente,
É a certeza da realidade e imortalidade das coisas, da excelência das coisas;
Há algo no flutuar da visão das coisas que a provoca para fora da alma.

Agora eu reexamino filosofias e religiões,
Elas podem funcionar bem dentro das salas de aula,
mas simplesmente não funcionam sob nuvens espaçosas e ao redor da paisagem e das correntes que fluem.

Aqui está a compreensão,
Aqui está um homem apurado - ele compreende aqui o que ele tem em si,
O passado, o futuro, majestade, amor - se eles estão ausentes de você, você está ausente deles.

Apenas o núcleo de cada objeto nutre;
Onde está aquele que rasga as cascas para você e para mim?
Onde está aquele que desfaz estratagemas e envólucros para você e para mim?

Aqui está a adesão, ela não é previamente formada, é oportuna;
Você sabe o que é ser amado por estranhos ao passar?
Você conhece a fala daqueles olhos que se viram?


7.
Aqui está o efluxo da alma,
O efluxo da alma vem de dentro através de portões amparadores, sempre provocando questões,
Estes anseios por que eles existem? Estes pensamentos na escuridão por que eles existem?
Por que há homens e mulheres que quando estão perto de mim a luz do sol expande o meu sangue?
Por que quando eles me deixam minhas flâmulas de alegria se afundam lisas e planas?
Por que há árvores sob as quais eu nunca caminho mas de onde pensamentos grandes e melodiosos recaem sobre mim?
(Eu acho que eles ficam lá pendurados verões e invernos naquelas árvores e sempre deixam cair frutos quando eu passo)
O que é isto que eu troco tão subitamente com estranhos?
Com algum motorista enquanto eu viajo sentado ao seu lado?
Com algum pescador arrastando sua rede pela praia enquanto eu passo por lá e paro?
O que me dá ser livre com a benevolência de uma mulher ou um homem? O que lhes dá serem livres com a minha?


8.
O efluxo da alma é felicidade, aqui está a felicidade,
Eu acho que ela impregna o ar aberto, esperando em todos os momentos,
Agora ela flui até nós, nós estamos verdadeiramente carregados.

Aqui se ergue o fluído e seu caráter conector,
O fluído e seu caráter conector é o frescor e a doçura de homem e mulher,
(As ervas da manhã não brotam todos os dias mais frescas e doces das raízes de si mesmas do que ele brota fresco e doce continuamente de si mesmo)

Em direção ao fluído e seu caráter conector exala o suor do amor de jovem e velho,
Dele cai o feitiço destilado que zomba da beleza e dos feitos,
Em direção a ele suspira a dor que estremece de saudades do contato.


9.
Allons! Quem quer que você seja venha viajar comigo!
Viajando comigo você encontra o que nunca cansa.

A terra nunca cansa,
A terra é rude, silenciosa, incompreensível no começo, a Natureza é rude e incompreensível no começo,
Não se desencoraje, continue, há coisas divinas bem encobertas,
Eu te juro há coisas divinas mais bonitas do que as palavras podem dizer.

Allons! Não devemos parar aqui,
Por mais doces que sejam estes armazéns cobertos, por mais conveniente que seja esta morada nós não podemos permanecer aqui,
Por mais protegido que seja este porto e por mais calmas estas águas nós não devemos ancorar aqui,
Por mais bem-vinda que seja a hospitalidade que nos cerca nós só podemos receber um pouco dela.


10.
Allons! Os incentivos deverão ser maiores,
Nós navegaremos sem trilhas e em mares selvagens,
Nós iremos onde os ventos sopram, as ondas quebram e o veleiro Yankee acelera com suas velas cheias.

Allons! Com poder, liberdade, a terra, os elementos,
Saúde, questionamento, alegria, auto-estima, curiosidade;
Allons! De todas as fórmulas!
De todas as suas fórmulas, Ó padres materialistas com olhos de morcego.

O cadáver embolorado bloqueia a passagem - o enterro já não pode esperar.

Allons! Ainda assim, atenção!
Aquele que viaja comigo precisa do melhor sangue, músculo, resistência,
Nenhum poderá ser testado até que ele ou ela traga coragem e saúde,
Não venha aqui se você já gastou o melhor de si,
Só podem vir aqueles que vêm em corpos doces e decididos,
Nenhuma pessoa doente, nenhum bebedor de rum ou mácula venérea é permitida aqui.

(Eu e meu não convencemos por argumentos, símiles, rimas,
Nós convencemos com nossa presença).


11
Ouçam! Eu serei honesto com vocês,
Eu não ofereço os velhos prêmios suaves, mas os novos prêmios rudes,
Estes são os dias que têm que acontecer com vocês:
Vocês não devem amontoar o que é chamado de riquezas,
Vocês devem espalhar com mãos generosas tudo o que ganharem ou conseguirem,
Vocês quando chegarem a uma cidade destino, vocês mal aproveitarão a satisfação antes de serem chamados por um chamado irresistível de partir,
Vocês serão tratados com sorrisos irônicos e zombaria por aqueles que ficarem para trás,
Os acenos de amor que vocês receberem deverão ser respondidos com beijos apaixonados de partida,
Vocês não devem permitir o aperto daqueles que lançam suas mãos em busca de vocês.


12
Allons! Em busca dos grandes Companheiros, e de pertencer a eles!
Eles também estão na estrada - são os homens ágeis e majestosos - são as maiores mulheres,
Adoradores das calmas dos mares e das tempestades dos mares,
Marinheiros de muitos barcos, caminhantes de terras de muitas léguas,
Habituès de muitos países distantes, habituès de moradas muito longínquas,
Confiadores de homens e mulheres, observadores de cidades, labutadores solitários,
Pausadores e contempladores de tufos, flores, conchas da praia,
Dançarinos em bailes de casamento, beijadores de noivas, tenros ajudadores de crianças, carregadores de crianças,
Soldados de revoltas, vigias de covas abertas, descedores de caixões,
Jornadeiros pelas estações do ano consecutivas, através dos anos, os anos estranhos cada um emergindo daquele que o precedeu,
Jornadeiros com companheiros: suas próprias fases diversas,
Caminheiros adiante dos latentes dias de infância irrealizados,
Jornadeiros alegremente com sua própria juventude, jornadeiros com sua masculinidade de barba bem feita,
Jornadeiros com sua mulheridade, ampla, insuperável, satisfeita,
Jornadeiros com sua própria sublime e velha idade de masculinidade e mulheridade,
Velha idade, calma, expandida, ampla com a larguidão altiva do universo,
Velha idade, correndo livre com a deliciosa liberdade da morte próxima.


13.
Allons! Para o que é sem fim como foi sem começo,
Para aguentar muito, caminhadas dos dias, repousos das noites,
Para juntar tudo na viagem que eles tendem a fazer, e os dias e as noites para os quais eles tendem,
Novamente juntá-los no início de jornadas superiores,
Não ver nada em lugar algum que não seja o que se possa alcançar e ultrapassar,
Não conceber nenhum tempo, por mais longínquo, que não aquele que se possa alcançar e ultrapassar,
Não buscar ou desprezar estrada alguma que não as que se alongam e esperam por você, por mais longínquas mas que se alongam e esperam por você,
Não ver nenhum ser, nem de Deus, nem nenhum mas ir também até lá,
Não ver nenhuma posse mas poder tê-la, desfrutando de tudo sem trabalho ou compra, abstraindo o banquete sem abstrair uma partícula dele,
Tomar o melhor da fazenda do fazendeiro e da mansão elegante do homem rico, e as bençãos puras do casal bem casado, e as frutas das pomares e as flores dos jardins,
Tomar para seu uso próprio das cidades compactadas ao passar por elas,
carregar depois consigo prédios e ruas para onde quer que vá,
Recolher as mentes dos homens dos seus cérebros ao encontrá-los, recolher o amor dos seus corações,
Levar seus amores consigo na estrada, por tudo que você deixa para trás,
Conhecer o próprio universo como uma estrada, como muitas estradas, como estradas para almas viajantes.

Tudo parte para longe pelo progresso das almas,
Toda religião, todas as coisas sólidas, artes, governos - tudo o que foi ou é aparente sobre este ou outro globo cai em nichos e esquinas antes da procissão das almas pelas grandes estradas do universo.

Diante do progresso das almas de homens e mulheres pelas grandes estradas do universo, todo outro progresso é o emblema e o suporte necessários.

Para sempre vivos, para sempre adiante,
Imponentes, solenes, tristes, recolhidos, perplexos, loucos, turbulentos, débeis, insatisfeitos,
Desesperados, orgulhosos, afeiçoados, doentes, aceitos por homens, rejeitados por mulheres,
Eles vão! Eles vão! Eu sei que eles vão, mas não sei para onde vão,
Mas sei que vão em direção ao melhor - em direção a algo grande!

Quem quer que você seja, venha adiante! Homem ou mulher venha adiante!
Você não deve ficar dormindo ou se arrastando pela casa, mesmo que você a tenha construído ou que ela tenha sido construída para você.

Sair do confinamento escuro! Sair de trás da tela!
É inútil protestar, eu sei de tudo e o exponho.

Observe através de você tão mau quanto o resto,
Através da risada, do dançar, do jantar, do cear, das pessoas,
Dentro dos vestidos e ornamentos, dentro daqueles rostos lavados e aparados,
Observe uma repulsa e um desespero, secretos e silenciosos.

Nenhum marido, nenhuma esposa, nenhum amigo confiável para ouvir a confissão,
Outro eu, um duplo de cada um, se ocultando e se escondendo,
Sem forma e sem palavras pelas ruas das cidades, educado e brando nos salões,
Nos vagões das ferrovias, nos barcos a vapor, nas assembleias públicas,
Lar para as casas de homens e mulheres, na mesa, no quarto, em todo lugar,
Elegantemente vestido, semblante sorridente, postura ereta, morte atrás dos ossos do peito, inferno atrás dos ossos do crânio,
Sob o colete e as luvas, sob as fitas e flores artificiais,
Mantendo-se dentro dos costumes, não falando uma sílaba sobre si mesmo,
Falando sobre qualquer outra coisa, mas nunca de si mesmo.


14
Allons! Através de lutas e guerras!
O objetivo que não foi nomeado não pode ser revogado.

Foram bem-sucedidas as lutas passadas?
O que foi bem-sucedido? Você? Sua nação? A natureza?
Entendam-me bem agora - é dado pela essência das coisas que de qualquer fruto de sucesso, não importa qual, deverá vir adiante algo que fará uma luta ainda maior ser necessária.

Meu chamado é o chamado de batalha, eu nutro rebeliões ativas,
Aquele que vai comigo tem de ir bem armado,
Aquele que vai comigo tem frequentemente uma dieta esparsa, pobreza, inimigos raivosos, deserções.


15
Allons! A estrada está diante de nós!
É seguro - eu a testei - meus próprios pés a testaram bem - não se detenham!

Deixem o papel ficar sobre a mesa sem escritura, e o livro na prateleira sem ser aberto!
Deixem as ferramentas ficarem na oficina! Deixem o dinheiro ficar sem ser ganho!
Deixem a escola ficar lá! Não prestem atenção ao choro do professor!
Deixem o pregador em seu púlpito! Deixem o advogado argumentar na corte e o juiz expôr a lei.

Camerado, eu te dou minha mão!
Eu te dou meu amor, mais precioso que o dinheiro,
Eu te dou a mim mesmo, antes da prédica ou da lei;
Você me dará a si mesmo? Você virá viajar comigo?
Ficaremos colados um ao outro enquanto vivermos?




Song of the open road

1
Afoot and light-hearted I take to the open road,
Healthy, free, the world before me,
The long brown path before me leading wherever I choose.

Henceforth I ask not good-fortune, I myself am good-fortune,
Henceforth I whimper no more, postpone no more, need nothing,
Done with indoor complaints, libraries, querulous criticisms,
Strong and content I travel the open road.

The earth, that is sufficient,
I do not want the constellations any nearer,
I know they are very well where they are,
I know they suffice for those who belong to them.

(Still here I carry my old delicious burdens,
I carry them, men and women, I carry them with me wherever I go,
I swear it is impossible for me to get rid of them,
I am fill’d with them, and I will fill them in return.)


2
You road I enter upon and look around, I believe you are not all that is here,
I believe that much unseen is also here.

Here the profound lesson of reception, nor preference nor denial,
The black with his woolly head, the felon, the diseas’d, the illiterate person, are not denied;
The birth, the hasting after the physician, the beggar’s tramp, the drunkard’s stagger, the laughing party of mechanics,
The escaped youth, the rich person’s carriage, the fop, the eloping couple,

The early market-man, the hearse, the moving of furniture into the town, the return back from the town,
They pass, I also pass, any thing passes, none can be interdicted,
None but are accepted, none but shall be dear to me.


3
You air that serves me with breath to speak!
You objects that call from diffusion my meanings and give them shape!
You light that wraps me and all things in delicate equable showers!
You paths worn in the irregular hollows by the roadsides!
I believe you are latent with unseen existences, you are so dear to me.

You flagg’d walks of the cities! you strong curbs at the edges!
You ferries! you planks and posts of wharves! you timber-lined sides! you distant ships!

You rows of houses! you window-pierc’d façades! you roofs!
You porches and entrances! you copings and iron guards!
You windows whose transparent shells might expose so much!
You doors and ascending steps! you arches!
You gray stones of interminable pavements! you trodden crossings!
From all that has touch’d you I believe you have imparted to yourselves, and now would impart the same secretly to me,
From the living and the dead you have peopled your impassive surfaces, and the spirits thereof would be evident and amicable with me.


4
The earth expanding right hand and left hand,
The picture alive, every part in its best light,
The music falling in where it is wanted, and stopping where it is not wanted,
The cheerful voice of the public road, the gay fresh sentiment of the road.

O highway I travel, do you say to me Do not leave me?
Do you say Venture not—if you leave me you are lost?
Do you say I am already prepared, I am well-beaten and undenied, adhere to me?

O public road, I say back I am not afraid to leave you, yet I love you,
You express me better than I can express myself,
You shall be more to me than my poem.

I think heroic deeds were all conceiv’d in the open air, and all free poems also,
I think I could stop here myself and do miracles,
I think whatever I shall meet on the road I shall like, and whoever beholds me shall like me,
I think whoever I see must be happy.


5
From this hour I ordain myself loos’d of limits and imaginary lines,
Going where I list, my own master total and absolute,
Listening to others, considering well what they say,
Pausing, searching, receiving, contemplating,
Gently,but with undeniable will, divesting myself of the holds that would hold me.
I inhale great draughts of space,
The east and the west are mine, and the north and the south are mine.

I am larger, better than I thought,
I did not know I held so much goodness.

All seems beautiful to me,
I can repeat over to men and women You have done such good to me I would do the same to you,
I will recruit for myself and you as I go,
I will scatter myself among men and women as I go,
I will toss a new gladness and roughness among them,
Whoever denies me it shall not trouble me,
Whoever accepts me he or she shall be blessed and shall bless me.


6
Now if a thousand perfect men were to appear it would not amaze me,
Now if a thousand beautiful forms of women appear’d it would not astonish me.

Now I see the secret of the making of the best persons,
It is to grow in the open air and to eat and sleep with the earth.

Here a great personal deed has room,
(Such a deed seizes upon the hearts of the whole race of men,
Its effusion of strength and will overwhelms law and mocks all authority and all argument against it.)

Here is the test of wisdom,
Wisdom is not finally tested in schools,
Wisdom cannot be pass’d from one having it to another not having it,
Wisdom is of the soul, is not susceptible of proof, is its own proof,
Applies to all stages and objects and qualities and is content,
Is the certainty of the reality and immortality of things, and the excellence of things;
Something there is in the float of the sight of things that provokes it out of the soul.

Now I re-examine philosophies and religions,
They may prove well in lecture-rooms, yet not prove at all under the spacious clouds and along the landscape and flowing currents.

Here is realization,
Here is a man tallied—he realizes here what he has in him,
The past, the future, majesty, love—if they are vacant of you, you are vacant of them.

Only the kernel of every object nourishes;
Where is he who tears off the husks for you and me?
Where is he that undoes stratagems and envelopes for you and me?

Here is adhesiveness, it is not previously fashion’d, it is apropos;
Do you know what it is as you pass to be loved by strangers?
Do you know the talk of those turning eye-balls?


7
Here is the efflux of the soul,
The efflux of the soul comes from within through embower’d gates, ever provoking questions,
These yearnings why are they? these thoughts in the darkness why are they?
Why are there men and women that while they are nigh me the sunlight expands my blood?
Why when they leave me do my pennants of joy sink flat and lank?
Why are there trees I never walk under but large and melodious thoughts descend upon me?
(I think they hang there winter and summer on those trees and always drop fruit as I pass;)
What is it I interchange so suddenly with strangers?
What with some driver as I ride on the seat by his side?
What with some fisherman drawing his seine by the shore as I walk by and pause?
What gives me to be free to a woman’s and man’s good-will? what gives them to be free to mine?


8
The efflux of the soul is happiness, here is happiness,
I think it pervades the open air, waiting at all times,
Now it flows unto us, we are rightly charged.

Here rises the fluid and attaching character,
The fluid and attaching character is the freshness and sweetness of man and woman,
(The herbs of the morning sprout no fresher and sweeter every day out of the roots of themselves, than it sprouts fresh and sweet continually out of itself.)

Toward the fluid and attaching character exudes the sweat of the love of young and old,
From it falls distill’d the charm that mocks beauty and attainments,
Toward it heaves the shuddering longing ache of contact.


9
Allons! whoever you are come travel with me!
Traveling with me you find what never tires.

The earth never tires,
The earth is rude, silent, incomprehensible at first, Nature is rude and incomprehensible at first,
Be not discouraged, keep on, there are divine things well envelop’d,
I swear to you there are divine things more beautiful than words can tell.

Allons! we must not stop here,
However sweet these laid-up stores, however convenient this dwelling we cannot remain here,
However shelter’d this port and however calm these waters we must not anchor here,
However welcome the hospitality that surrounds us we are permitted to receive it but a little while.


10
Allons! the inducements shall be greater,
We will sail pathless and wild seas,
We will go where winds blow, waves dash, and the Yankee clipper speeds by under full sail.

Allons! with power, liberty, the earth, the elements,
Health, defiance, gayety, self-esteem, curiosity;
Allons! from all formules!
From your formules, O bat-eyed and materialistic priests.

The stale cadaver blocks up the passage—the burial waits no longer.

Allons! yet take warning!
He traveling with me needs the best blood, thews, endurance,
None may come to the trial till he or she bring courage and health,
Come not here if you have already spent the best of yourself,
Only those may come who come in sweet and determin’d bodies,
No diseas’d person, no rum-drinker or venereal taint is permitted here.

(I and mine do not convince by arguments, similes, rhymes,
We convince by our presence.)


11
Listen! I will be honest with you,
I do not offer the old smooth prizes, but offer rough new prizes,
These are the days that must happen to you:
You shall not heap up what is call’d riches,
You shall scatter with lavish hand all that you earn or achieve,
You but arrive at the city to which you were destin’d, you hardly settle yourself to satisfaction before you are call’d by an irresistible call to depart,
You shall be treated to the ironical smiles and mockings of those who remain behind you,
What beckonings of love you receive you shall only answer with passionate kisses of parting,
You shall not allow the hold of those who spread their reach’d hands toward you.


12
Allons! after the great Companions, and to belong to them!
They too are on the road—they are the swift and majestic men—they are the greatest women,
Enjoyers of calms of seas and storms of seas,
Sailors of many a ship, walkers of many a mile of land,
Habituès of many distant countries, habituès of far-distant dwellings,
Trusters of men and women, observers of cities, solitary toilers,
Pausers and contemplators of tufts, blossoms, shells of the shore,
Dancers at wedding-dances, kissers of brides, tender helpers of children, bearers of children,
Soldiers of revolts, standers by gaping graves, lowerers-down of coffins,
Journeyers over consecutive seasons, over the years, the curious years each emerging from that which preceded it,
Journeyers as with companions, namely their own diverse phases,
Forth-steppers from the latent unrealized baby-days,
Journeyers gayly with their own youth, journeyers with their bearded and well-grain’d manhood,
Journeyers with their womanhood, ample, unsurpass’d, content,
Journeyers with their own sublime old age of manhood or womanhood,
Old age, calm, expanded, broad with the haughty breadth of the universe,
Old age, flowing free with the delicious near-by freedom of death.


13
Allons! to that which is endless as it was beginningless,
To undergo much, tramps of days, rests of nights,
To merge all in the travel they tend to, and the days and nights they tend to,
Again to merge them in the start of superior journeys,
To see nothing anywhere but what you may reach it and pass it,
To conceive no time, however distant, but what you may reach it and pass it,
To look up or down no road but it stretches and waits for you, however long but it stretches and waits for you,
To see no being, not God’s or any, but you also go thither,
To see no possession but you may possess it, enjoying all without labor or purchase, abstracting the feast yet not abstracting one particle of it,
To take the best of the farmer’s farm and the rich man’s elegant villa, and the chaste blessings of the well-married couple, and the fruits of orchards and flowers of gardens,
To take to your use out of the compact cities as you pass through,
To carry buildings and streets with you afterward wherever you go,
To gather the minds of men out of their brains as you encounter them, to gather the love out of their hearts,
To take your lovers on the road with you, for all that you leave them behind you,
To know the universe itself as a road, as many roads, as roads for traveling souls.

All parts away for the progress of souls,
All religion, all solid things, arts, governments—all that was or is apparent upon this globe or any globe, falls into niches and corners before the procession of souls along the grand roads of the universe.

Of the progress of the souls of men and women along the grand roads of the universe, all other progress is the needed emblem and sustenance.

Forever alive, forever forward,
Stately, solemn, sad, withdrawn, baffled, mad, turbulent, feeble, dissatisfied,
Desperate, proud, fond, sick, accepted by men, rejected by men,
They go! they go! I know that they go, but I know not where they go,
But I know that they go toward the best—toward something great.

Whoever you are, come forth! or man or woman come forth!
You must not stay sleeping and dallying there in the house, though you built it, or though it has been built for you.

Out of the dark confinement! out from behind the screen!
It is useless to protest, I know all and expose it.

Behold through you as bad as the rest,
Through the laughter, dancing, dining, supping, of people,
Inside of dresses and ornaments, inside of those wash’d and trimm’d faces,
Behold a secret silent loathing and despair.

No husband, no wife, no friend, trusted to hear the confession,
Another self, a duplicate of every one, skulking and hiding it goes,
Formless and wordless through the streets of the cities, polite and bland in the parlors,
In the cars of railroads, in steamboats, in the public assembly,
Home to the houses of men and women, at the table, in the bedroom, everywhere,
Smartly attired, countenance smiling, form upright, death under the breast-bones, hell under the skull-bones,
Under the broadcloth and gloves, under the ribbons and artificial flowers,
Keeping fair with the customs, speaking not a syllable of itself,
Speaking of any thing else but never of itself.


14
Allons! through struggles and wars!
The goal that was named cannot be countermanded.

Have the past struggles succeeded?
What has succeeded? yourself? your nation? Nature?
Now understand me well—it is provided in the essence of things that from any fruition of success, no matter what, shall come forth something to make a greater struggle necessary.

My call is the call of battle, I nourish active rebellion,
He going with me must go well arm’d,
He going with me goes often with spare diet, poverty, angry enemies, desertions.


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Allons! the road is before us!
It is safe—I have tried it—my own feet have tried it well—be not detain’d!

Let the paper remain on the desk unwritten, and the book on the shelf unopen’d!
Let the tools remain in the workshop! let the money remain unearn’d!
Let the school stand! mind not the cry of the teacher!
Let the preacher preach in his pulpit! let the lawyer plead in the court, and the judge expound the law.

Camerado, I give you my hand!
I give you my love more precious than money,
I give you myself before preaching or law;
Will you give me yourself? will you come travel with me?
Shall we stick by each other as long as we live?



Walt Whitman - Tradução: Tomaz Amorim Izabel

Criar



















Criar criar
criar no espírito criar no músculo criar no nervo
criar no homem criar na massa
criar
criar com os olhos secos


Criar criar
sobre a profanação da floresta
sobre a fortaleza impudica do chicote
criar sobre o perfume dos troncos serrados
criar
criar com os olhos secos


Criar criar
gargalhadas sobre o escárnio da palmatória
coragem nas pontas das botas do roceiro
força no esfrangalhado das portas violentadas
firmeza no vermelho-sangue da insegurança
criar
criar com os olhos secos


Criar criar
estrelas sobre o camartelo guerreiro
paz sobre o choro das crianças
paz sobre o suor sobre a lágrima do contrato
paz sobre o ódio
criar
criar paz com os olhos secos.
Criar criar
criar liberdade nas estradas escravas
algemas de amor nos caminhos paganizados do amor


sons festivos sobre o balanceio dos corpos em forcas
[simuladas


criar
criar amor com os olhos secos.



Agostinho Neto

Acréscimos























Escrevo poemas
dando a minha parte.
Acrescento gotas
ao que é imenso,
primordial.

Assim:
como quem chorasse
dentro do mar.



Maria Helena Latini, Múltiplo Um, Editora Literacidade

Nec Mergitur















A sorte, muita vez, é bem amarga.
Vai-se, corrente abaixo, sem sentir,
e eis, de repente, o passo nos embarga
um cachão de água brava a refluir.

Eis a piroga a corcovar de ilharga,
a vela a estremeer, a ir, a vir;
eis que rolou por água abaixo a carga,
eis a água pelas bordas a subir.

Mas tenhamos paciência! Ao menos esta
não sossobre aos boleus da sorte infesta,
para todo o perdido recompor;

e, se o não recompõe, ao menos, diga:
— Raivai, águas! Raivai, sorte inimiga!
exijo inteiro o meu quinhão de dor.



 Amadeu Amaral -(, de Lâmpada Antiga, 1921)

Adeus à hora da largada










Minha Mãe
(todas as mães negras
cujos filhos partiram)
tu me ensinaste a esperar
como esperaste nas horas difíceis


Mas a vida
matou em mim essa mística esperança


Eu já não espero
sou aquele por quem se espera


Sou eu minha Mãe
a esperança somos nós
os teus filhos
partidos para uma fé que alimenta a vida


Hoje
somos as crianças nuas das sanzalas do mato
os garotos sem escola a jogar a bola de trapos
nos areais ao meio-dia
somos nós mesmos
os contratados a queimar vidas nos cafezais
os homens negros ignorantes
que devem respeitar o homem branco
e temer o rico
somos os teus filhos
dos bairros de pretos
além aonde não chega a luz elétrica
os homens bêbedos a cair
abandonados ao ritmo dum batuque de morte
teus filhos
com fome
com sede
com vergonha de te chamarmos Mãe
com medo de atravessar as ruas
com medo dos homens
nós mesmos


Amanhã
entoaremos hinos à liberdade
quando comemorarmos
a data da abolição desta escravatura


Nós vamos em busca de luz
os teus filhos Mãe
(todas as mães negras
cujos filhos partiram)
Vão em busca de vida.


(Sagrada esperança)



Agostinho Neto

O Alfa e o Ômega


















Carregas tuas coisas
E na verdade nada tens
Elas apenas te parecem
Tuas
Teu, mesmo, é só teu consolo
De ter a ti ainda
Para que esperes que possas ter
Algo mais que outras coisas
Tu que fora de ti nada tens nem nunca terás
Tu que fora de ti nada és nem nunca serás
Tu, eterno efêmero buscante
Do que primeiro e último se chama Amor.



Adriane Garcia - O nome do mundo - ed. Armazém da cultura 2014.

SÓ O SOFRIMENTO NÃO SE TERCEIRIZA​



Aquele que ativa o botão da máquina
Veste um cinza semi invisível
Só o sofrimento não se terceiriza
Pois pra cada lombo há uma chibata

Gente moendo carne de gente
Servida estragada ao chão da fábrica
Enquanto suas massas encefálicas
Eclodem de angústias quase mudas

As dores duradouras querem férias
Mas quando se institui a miséria
A uniformidade linda e bela
Faz da migalha não misericórdia

Mas ouro pra quem nada tem na horta
E antes do sol nascer também acorda
E sofre à flor da idade a sua poda
Morrendo quase no fim da jornada


Alan Salgueiro
Rascunhos de Revolução

O Choro de África


















O choro durante séculos
nos seus olhos traidores pela servidão dos homens
no desejo alimentado entre ambições de lufadas românticas
nos batuques choro de África
nos sorrisos choro de África
nos sarcasmos no trabalho choro de África


Sempre o choro mesmo na vossa alegria imortal
meu irmão Nguxi e amigo Mussunda
no círculo das violências
mesmo na magia poderosa da terra
e da vida jorrante das fontes e de toda a parte e de todas as almas
e das hemorragias dos ritmos das feridas de África


e mesmo na morte do sangue ao contato com o chão
mesmo no florir aromatizado da floresta
mesmo na folha
no fruto
na agilidade da zebra
na secura do deserto
na harmonia das correntes ou no sossego dos lagos
mesmo na beleza do trabalho construtivo dos homens


o choro de séculos
inventado na servidão
em historias de dramas negros almas brancas preguiças
e espíritos infantis de África
as mentiras choros verdadeiros nas suas bocas


o choro de séculos
onde a verdade violentada se estiola no circulo de ferro
da desonesta forca
sacrificadora dos corpos cadaverizados
inimiga da vida


fechada em estreitos cérebros de maquinas de contar
na violência
na violência
na violência


O choro de África e' um sintoma


Nos temos em nossas mãos outras vidas e alegrias
desmentidas nos lamentos falsos de suas bocas - por nós!
E amor
e os olhos secos.



Agostinho Neto

Há Tempos























Parece cocaína mas é só tristeza, talvez tua cidade
Muitos temores nascem do cansaço e da solidão
Descompasso, desperdício
Herdeiros são agora da virtude que perdemos
Há tempos tive um sonho
Não me lembro, não me lembro

Tua tristeza é tão exata
E hoje o dia é tão bonito
Já estamos acostumados
A não termos mais nem isso

Os sonhos vêm e os sonhos vão
E o resto é imperfeito
Dissestes que se tua voz
Tivesse força igual
À imensa dor que sentes
Teu grito acordaria
Não só a tua casa
Mas a vizinhança inteira

E há tempos nem os santos
Têm ao certo a medida da maldade
E há tempos são os jovens que adoecem
E há tempos o encanto está ausente
E há ferrugem nos sorrisos
Só o acaso estende os braços
A quem procura abrigo e proteção
Meu amor!

Disciplina é liberdade
Compaixão é fortaleza
Ter bondade é ter coragem
Lá em casa tem um poço
Mas a água é muito limpa


Renato Russo - Legião Urbana

Soneto XIII


















Ah, se pudesses ser quem és! Mas, amado,
Tens a vida apenas enquanto ela pertence a ti.
Deverias te preparar para um fim tão próximo,
E a outro emprestar o teu doce semblante.

Assim, se a beleza que deténs em vida
Não tiver um fim, então, viverias
Novamente após a tua morte,
Quando a tua doce prole ostentasse a tua doce forma.

Quem poderia ruir uma casa assim tão bela,
Cuja economia em honra se poderia prevenir
Contra o vento impiedoso dos dias frios,
E a estéril fúria do eterno estupor da morte?

Ó, quanto desperdício! Meu caro, sabes
Que tiveste um pai: deixa o teu filho dizer o mesmo.



Sonnets

O that you were your self, but love you are
No longer yours, than you your self here live,
Against this coming end you should prepare,
And your sweet semblance to some other give.

So should that beauty which you hold in lease
Find no determination, then you were
Your self again after your self's decease,
When your sweet issue your sweet form should bear.

Who lets so fair a house fall to decay,
Which husbandry in honour might uphold,
Against the stormy gusts of winter's day
And barren rage of death's eternal cold?

O none but unthrifts, dear my love you know,
You had a father, let your son say so.


William Shakespeare - Tradução de Thereza Christina Rocque da Motta

A tranquilidade na solidão














Noites sem nome, do tempo desligadas,
Solidão mais pura do que o fogo e a água,
Silêncio altíssimo e brilhante.

As imagens vivem e vão cantando libertadas
E no secreto murmurar de cada instante
Colhi a absolvição de toda a mágoa.


Sophia de Mello Breyner Andresen

Canção de Outono


















Perdoa-me, folha seca,
não posso cuidar de ti.
Vim para amar neste mundo,
e até do amor me perdi.

De que serviu tecer flores
pelas areias do chão,
se havia gente dormindo
sobre o próprio coração?

E não pude levantá-la!
Choro pelo que não fiz.
E pela minha fraqueza
é que sou triste e infeliz.

Perdoa-me, folha seca!
Meus olhos sem força estão
velando e rogando áqueles
que não se levantarão...

Tu és a folha de outono
voante pelo jardim.
Deixo-te a minha saudade
- a melhor parte de mim.
Certa de que tudo é vão.

Que tudo é menos que o vento,
menos que as folhas do chão...



Cecília Meireles

Horizonte

















O mar anterior a nós, teus medos
Tinham coral e praias e arvoredos.
Desvendadas a noite e a cerração,
As tormentas passadas e o mistério,
Abria em flor o Longe, e o Sul sidério
'Splendia sobre as naus da iniciação.
Linha severa da longínqua costa
— Quando a nau se aproxima ergue-se a encosta
Em árvores onde o longe nada tinha;
Mais perto, abre-se a terra em sons e cores:
E, no desembarcar, há aves, flores,
Onde era só, de longe a abstrata linha
O sonho é ver as formas invisíveis
Da distância imprecisa, e, com sensíveis
Movimentos da esp'rança e da vontade,
Buscar na linha fria do horizonte
A árvore, a praia, a flor, a ave, a fonte
— Os beijos merecidos da Verdade.



Fernando Pessoa

Não Basta


















Não basta abrir a janela
Para ver os campos e o rio.
Não é bastante não ser cego
Para ver as árvores e as flores.
É preciso também não ter filosofia nenhuma.
Com filosofia não há árvores: há idéias apenas.
Há só cada um de nós, como uma cave.
Há só uma janela fechada, e todo o mundo lá fora;
E um sonho do que se poderia ver se a janela se abrisse,
Que nunca é o que se vê quando se abre a janela.



Alberto Caeiro

Tortura


















Tirar dentro do peito a Emoção,
A lúcida Verdade, o Sentimento!
-- E ser, depois de vir do coração,
Um punhado de cinza esparso ao vento!...

Sonhar um verso de alto pensamento,
E puro como um ritmo de oração!
-- E ser, depois de vir do coração,
O pó, o nada, o sonho dum momento...

São assim ocos, rudes, os meus versos:
Rimas perdidas, vendavais dispersos,
Com que eu iludo os outros, com que minto!

Quem me dera encontrar o verso puro,
O verso altivo e forte, estranho e duro,
Que dissesse, a chorar, isto que sinto!!



Florbela Espanca

Ninguém


















Ninguém se engane se soar a hora,
se todos os relógios, de repente,
gaguejarem nem sei que dor fremente
que nunca veio e não se foi embora.

Ninguém se engane se souber quem chora,
que um grande choro convulsivo e quente
virá das coisas como espada ardente
atravessando a carne ontem, agora.

Ninguém se engane se dos seus papéis,
dos seus livros inertes, um lamento
terrível se levante como um vento

De maldição e de intenções cruéis.
Tudo, a este instante, é como um grande grito
quase a romper as cercas do infinito.


Alphonsus de Guimaraens Filho


A Poesia - 8 Anos do blog Nossa Poesia de Cada Dia






















Difícil, estreita passagem,
força quente perscrutada,
corpo de névoa, de imagem,
com sulcos de tatuagem,
voz absoluta escutada...

Destino de aranha, tece
com fios vários da vida
alegria se amanhece
ou chora se a luz fenece
pela noite perseguida.

Intimidade exterior,
pureza de impuras formas,
conhecimento e amor,
água límpida, estertor,
sem regras feita de normas.




António Salvado, in "Difícil Passagem"



Agradecimentos:

Ao meu Deus pela persistência e viver este espaço. A minha família a paciência pelo tempo cedido. A grupo blogger pela o acesso deste canal. Aos amigos que seguem no facebook, no google+, e outros tipos de caminhos.

Aos Poetas que nos deixaram estes versos... Aos amigos Poetas e amigos que conheci através deste espaço. Meu Muito Obrigado!


Com esta postagem chegamos ao número de 2176 publicações, com 86 seguidores, e 49 seguidores google+, foram 166.118 visualizações. Continuem nos acompanhando.


Obrigado também pelo carinho com meus próprios versos!


Obrigado por tudo e à todos!



Henrique Rodrigues Soares

Companheiros



















quero
escrever-me de homens
quero
calçar-me de terra
quero ser
a estrada marinha
que prossegue depois do último caminho

e quando ficar sem mim
não terei escrito
senão por vós
irmãos de um sonho
por vós
que não sereis derrotados

deixo
a paciência dos rios
a idade dos livros

mas não lego
mapa nem bússola
porque andei sempre
sobre meus pés
e doeu-me
às vezes
viver
hei-de inventar
um verso que vos faça justiça

por ora
basta-me o arco-íris

em que vos sonho
basta-te saber que morreis demasiado
por viverdes de menos
mas que permaneceis sem preço

companheiros



Mia Couto

O Tempo seca o Amor

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