Sem pele


















A alma de toda a gente tem cercanias.
A minha, não tem.
É um descampado.
Não tem telhado, não tem paredes.
Muitas vezes, nem chão.

E sinto no peito as encostas
de tudo o que sangra e corrói.

Também toda a beleza me visita sem licença
e a poesia de tudo me acontece.
Mas a beleza, não raro, ela fere.

As garras de um beija-flor podem ser mortais
a uma alma sem pele.

Então, por isso, às vezes me exaspero e grito
para que o meu peito,
em desabrigo,
não seja tão violado.

Mas quando me sai o protesto,
as minhas palavras também me sangram
e morro mais um tanto por dentro.

Já não quero a palavra que afugenta a dor.
Quero o silêncio que cicatriza a ferida
e que me prepara para a dor mais forte:
a própria Vida.

Nara Rúbia Ribeiro, do livro “Pazes”, a publicar.

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