Sonhos






















FÔSSE-ME a infância um sonho prolongado!
Nem a alma despertasse, até que o brilho
da manhã viesse numa Eternidade!
Mesmo que o longo sonho fôsse triste,
desesperado, bem melhor seria
que o despertar da fria realidade,
para quem, no seu peito, só tem tido
e tem, na terra deliciosa, um caos 
de paixões fundas, desde o nascimento.
Mas seria – êsse sonho eternamente
continuado – tal como os outros eram,
na minha infância e, se me fôsse dado,
só um louco aspiraria a céu mais alto.
Tivesse eu mergulhado, à luz do sol,
num céu de estio, em sonhos de luz viva,
e de prazer, voasse o coração
a regiões imaginárias, longe
de meu lar, entre sêres só pensados
por mim – que mais eu quereria ver?
Uma vez. . . uma só – e essa hora estranha
jamais esquecerei – certo feitiço
ou poder me empolgou; o frio vento
fustigou-me, na noite, e deixou na alma
sua impressao. . . e, ou foi a lua cheia
brilhando, das alturas, no meu sono,
tão fria . . ou as estrêlas. . . ou o que fôsse,
tal sonho foi apenas como o vento
dessa noite... deixemo-lo passar.
Tenho sido feliz, embora em sonhos.
Tenho sido feliz, e amo dizê-lo.
Sonhos! Na sua forte côr de vida,
como nesse rumor sombrio, nevoento,
que imita a realidade, trazem, para
o delirante olhar, mais belas coisas
de Paraíso e Amor – e minhas, todas! –
do que já pôde a jovem Esperança
conhecer em suas horas de mais luz.


DREAMS.

OH! that my young life were a lasting dream!
My spirit not awakening, till the beam
Of an Eternity should bring the morrow.
Yes! tho' that long dream were of hopeless sorrow,
'Twere better than the cold reality
Of waking life, to him whose heart must be,
And hath been still, upon the lovely earth,
A chaos of deep passion, from his birth.

But should it be – that dream eternally
Continuing – as dreams have been to me
In my young boyhood – should it thus be given,
'Twere folly still to hope for higher Heaven.
For I have revell'd, when the sun was bright
I' the summer sky, in dreams of living light,
And loveliness, – have left my very heart
In climes of my imagining, apart
From mine own home, with beings that have been
Of mine own thought – what more could I have seen?

'Twas once – and only once – and the wild hour
From my remembrance shall not pass – some power
Or spell had bound me – 'twas the chilly wind
Came o'er me in the night, and left behind
Its image on my spirit – or the moon
Shone on my slumbers in her lofty noon
Too coldly – or the stars – howe'er it was
That dream was as that night-wind – let it pass.

I have been happy, tho' [but] in a dream.
I have been happy – and I love the theme:
Dreams! in their vivid coloring of life
As in that fleeting, shadowy, misty strife
Of semblance with reality which brings
To the delirious eye, more lovely things
Of Paradise and Love – and all our own!

Than young Hope in his sunniest hour hath known.

Edgar Allan Poe - 'Ficção completa, poesias & ensaios". [organização, tradução e anotações Oscar Mendes e Milton Amado]. Rio de Janeiro: Companhia Aguilar Editora, 1965. (grafia original 1965).

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